segunda-feira, 12 de julho de 2010

Borboleta

Na curva do rio que corre preguiçosamente entre os campos tem uma figueira. Na sombra desta um homem sentado com os olhos fincados na solidão, observa como a água acaricia as pedras, e como as avencas seguem sua teimosia de manter verde aquela barranca, cicatrizada pela erosão.
A transparência da água permite apreciar o bailado dos lambaris, e a calmaria forma sobre o poço uma tela de cristal líquido, onde ele assiste a um filme em flash back. O roteiro trata da história de um menino órfão que cresce livre sem alambrados a balizar suas idéias, e no desamparo vive batendo cabeça daqui e dali. E, neste cair e levantar constante vai tateando um rumo a seguir, em meio a complexos e preconceitos que lhe acompanham em sua adolescência.
Mas apesar do prognóstico sombrio, no meio de tantos revezes, ele meio que se salva mantendo-se aquém da linha tênue que separa o bem do mal. Consegue seguir em frente quando preconizavam que não iria longe, não caindo nas tentações próprias de quem entra no mundo dos adultos sem um costado, e consegue assim ir falquejando-se como um cidadão até que de boa marca.
E, além do mais o menino agora homem conseguiu transformar em amor todas aquelas mágoas que lhe instigaram até ali. Com um coração cheio de amor ele se entrega a cada vez que se apaixona sem reservas, sem receios, sem limites. E como não consegue equilibrar a razão com a emoção ao se entregar de corpo e alma novamente em sua vida vem o sofrimento. Pois para compensar carências de outrora, como um jogador novato ele apostara todas suas fichas.
Na amargura de um viver vazio, a dor, o preconceito e a mágoa são seus parceiros. Hoje ele segue se equilibrando como se estivesse caminhando no arame, e apesar de ter mantido seu caráter e uma postura de homem digno, ele se pergunta: para que? Ao mirar aquele espelho d’água ele só vê a figura de um homem sentado na sombra da figueira como uma figura inerte lá no fundo...
Eis que de repente em sua perna pousa uma borboleta e ele volta-se para ver aquela figura inquieta como a querer dizer-lhe algo. Ele sente uma lágrima rolar por sua face, e até ensaia um júbilo, mas desaprendeu de sorrir.
Mas agora o homem sentado na sombra da figueira tem os olhos fincados num fio de esperança, pois como ali naquele ponto o rio fêz uma curva e mudou sua trajetória, quem sabe ele consiga seguir aquela borboleta. Não importando para onde ela o leve, mas certamente novos rumos lhe trarão o que quase lhe falta: viver. Seja para amar seja para sofrer, mas viver!

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