Na curva do rio que corre preguiçosamente entre os campos tem uma figueira. Na sombra desta um homem sentado com os olhos fincados na solidão, observa como a água acaricia as pedras, e como as avencas seguem sua teimosia de manter verde aquela barranca, cicatrizada pela erosão.
A transparência da água permite apreciar o bailado dos lambaris, e a calmaria forma sobre o poço uma tela de cristal líquido, onde ele assiste a um filme em flash back. O roteiro trata da história de um menino órfão que cresce livre sem alambrados a balizar suas idéias, e no desamparo vive batendo cabeça daqui e dali. E, neste cair e levantar constante vai tateando um rumo a seguir, em meio a complexos e preconceitos que lhe acompanham em sua adolescência.
Mas apesar do prognóstico sombrio, no meio de tantos revezes, ele meio que se salva mantendo-se aquém da linha tênue que separa o bem do mal. Consegue seguir em frente quando preconizavam que não iria longe, não caindo nas tentações próprias de quem entra no mundo dos adultos sem um costado, e consegue assim ir falquejando-se como um cidadão até que de boa marca.
E, além do mais o menino agora homem conseguiu transformar em amor todas aquelas mágoas que lhe instigaram até ali. Com um coração cheio de amor ele se entrega a cada vez que se apaixona sem reservas, sem receios, sem limites. E como não consegue equilibrar a razão com a emoção ao se entregar de corpo e alma novamente em sua vida vem o sofrimento. Pois para compensar carências de outrora, como um jogador novato ele apostara todas suas fichas.
Na amargura de um viver vazio, a dor, o preconceito e a mágoa são seus parceiros. Hoje ele segue se equilibrando como se estivesse caminhando no arame, e apesar de ter mantido seu caráter e uma postura de homem digno, ele se pergunta: para que? Ao mirar aquele espelho d’água ele só vê a figura de um homem sentado na sombra da figueira como uma figura inerte lá no fundo...
Eis que de repente em sua perna pousa uma borboleta e ele volta-se para ver aquela figura inquieta como a querer dizer-lhe algo. Ele sente uma lágrima rolar por sua face, e até ensaia um júbilo, mas desaprendeu de sorrir.
Mas agora o homem sentado na sombra da figueira tem os olhos fincados num fio de esperança, pois como ali naquele ponto o rio fêz uma curva e mudou sua trajetória, quem sabe ele consiga seguir aquela borboleta. Não importando para onde ela o leve, mas certamente novos rumos lhe trarão o que quase lhe falta: viver. Seja para amar seja para sofrer, mas viver!
AMEI *-*
ResponderExcluirMuito bom o texto!