segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Berlinda

Acomodado num tronco de cinamomo caído que agora ele faz de banco, contempla o mato crescido nas cercanias do rancho. A última vez que deu um trato no jardim, esperanças ainda tinha de se ver novamente, com a volta de quem se foi. Cuidava com capricho do terreiro, do quintal, enfim da casa inteira, pois sabia que se ela chegasse nem que fosse pra buscar um esquecido, ia gostar de ver. E, quem sabe até resolvesse ficar.
Mas qual que, o tempo se passou e só ficaram as lembranças a perseguir-lhe por onde anda, e pra onde leva seus pensamentos.
Nesta manhã quente de verão sentado mateando, o chimarrão amarga como nunca. Coisas que antes abominava agora se tornaram corriqueiras. Entregou-se a vícios do fumo e do trago, numa fuga para aplacar sua dor. Às vezes se vê chorando baixinho e lágrimas rolam pelos vincos de sua face marcada pelo sofrimento. Sua cara, aliás, nem de longe se parece a mesma, barba por fazer e as melenas por cortar pra mais de quatro luas.
Pensou várias vezes em ir à cidade, cuidar de umas coisas e um pouco de si, mas fica relutando e adiando, pois se sente às vezes um pária sendo julgado, ou vê os outros com pena de sua desgraça. Ele antes alegre e crente na vida agora olha mais pro chão do que pra frente. Quando se encoraja, e pensa em tomar uma decisão anda a passos curtos e seu lampejo de coragem se esvai em seguida.
Até as cigarras com sua estridência típica da estação, que antes ele gostava de ouvir, agora soam como um coro de algozes zombando sua sina.
Sorvendo um mate misturado com lágrimas, eis que lhe tenta a idéia de parar de sofrer pela via mais torta. Mas ele se assusta de si mesmo.
Está certo que se não mudar sua atitude não irá longe, mas covarde não é, e ademais, apesar de tantas provações ainda crê na divindade. De pronto se apruma, discursando aos arbustos crescidos que encobrem a vista da casa. Não sabe ainda quanto viverá, mas se cair vai ser lutando e mais: Promete a si mesmo que não abdicará dos sonhos, de um dia, mostrar que podem judiar de seu corpo, podem maltratar sua alma, mas não vergarão seu caráter.
E até acredita um dia destes, quem sabe voltar a sorrir.

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